Adele van den Bergh: do Milena ao Excalibur
Figura 1. A família van den Bergh antes da guerra: Zadok e Charlotte van den Bergh (tios-avós de Adele), Betsy e Samuel van den Bergh (avós de Adele), Adele van den Bergh e Isaac van den Bergh (tio-avô de Adele) (Fonte: https://sousamendesfoundation.org/family/van-den-bergh)
Adele Margaretha van den Bergh nasceu no dia 21 de Maio de 1915, em Amsterdão (Holanda), tendo, assim, nacionalidade holandesa e era judia. Adele irá casar com o belga François Albert Fischer que nasceu em Bruxelas, Bélgica, a 28 de Agosto de 1914. Adele e François, sem se conhecerem, terminaram a universidade antes da guerra. Adele estava a estudar em Bruxelas. Ela era assistente social e recebeu o seu diploma universitário da ULB (Université Libre de Bruxelles). François era Engenheiro de Minas/Metalurgista ULB (Université Libre de Bruxelles) e depois de ter chegado aos EUA (década de 1950), recebeu a sua licenciatura em Engenharia Química (Universidade de Columbia, Nova Iorque). Como nos informou a sua filha Jeannette Valerie van den Bergh Fischer (conhecida como Cookie Fischer), de 1940-1945, François trabalhou no Congo belga com uma empresa mineira belga.
Figuras 2 a 7. Adele e os seus tios Max van den Bergh e a esposa Jeannette van den Bergh, Simon van den Bergh e a esposa Sonia van den Bergh e a filha destes, a sua prima Tamara van den Bergh (Fonte: https://sousamendesfoundation.org/family/van-den-bergh)
Adele era filha de George van den Bergh e Jeannette Elizabeth van Dantzig. Em 1940, em Baiona, quando recebe o visto de Aristides de Sousa Mendes, Adele tem 25 anos e está acompanhada dos seus tios Max van den Bergh e a esposa Jeannette van den Bergh (nascida Merloo) e Simon van den Bergh e a esposa Sonia van den Bergh (nascida Pokrojski) e a filha destes, a sua prima Tamara van den Bergh, de 26 anos.
Figuras 8 e 9. Fotografia de Adele van den Bergh e visto atribuído a Adele van den Bergh por Aristides de Sousa Mendes, a 21 de junho de 1940, em Baiona (Fonte: https://www.geni.com/people/Adele-Margaretha-van-den-Bergh/6000000023001884228 e https://sousamendesfoundation.org/family/van-den-bergh)
Adele e estes seus cinco familiares encontravam-se em França, em Nice, quando a Alemanha invadiu o país. De Nice saíram para La Baule, a 20 de maio de 1940, cerca de 20 pessoas, familiares ou próximas da família, em quatro ou cinco carros. No entanto, devido ao avanço rápido dos alemães, não chegam a ir para La Baule, mas chegam a Baiona em data indeterminada. A família van den Bergh obtém os vistos de Aristides de Sousa Mendes a 21 de junho de 1940. De facto, nesta data Aristides encontrava-se já em Baiona, onde os problemas verificados em Bordéus se repetiam. "A população da cidade tinha aumentado várias vezes e os requerentes de vistos portugueses eram aos milhares. Sem meios para responder a tamanha procura, o cônsul Faria Machado pediu inúmeras vezes ajuda a Aristides de Sousa Mendes. Com a diminuição do fluxo de pessoas em Bordéus, este deslocou-se a Bayonne para ajudar o seu colega. Como superior de Faria Machado, Aristides de Sousa Mendes ordenou-lhe que passasse os vistos que fossem necessários, livres de encargos, o que aconteceu a partir de 18/19 de Junho. Após ter recebido ordens de Pedro Teotónio Pereira, o embaixador português em Espanha, para abandonar o consulado, Aristides de Sousa Mendes continuou a conceder vistos na rua, no carro e no hotel". [1]
Como relata a sua filha Jeannette Valerie van den Bergh Fischer, no documentário «Vistos para a vida» da autoria da jornalista da SIC, Lúcia Gonçalves, os van den Bergh “reuniram-se todos em Baiona, juntando-se a outros judeus dos Países Baixos que estavam lá, tanto quanto sei eram cerca de 40. Pensaram em fretar um barco para os levar para Portugal, mesmo sem vistos. Esse barco foi o Milena”.
[1] http://mvasm.sapo.pt/BC/Acto-de-consci%C3%AAncia/pt
Como relata a sua filha Jeannette Valerie van den Bergh Fischer, no documentário «Vistos para a vida» da autoria da jornalista da SIC, Lúcia Gonçalves, os van den Bergh “reuniram-se todos em Baiona, juntando-se a outros judeus dos Países Baixos que estavam lá, tanto quanto sei eram cerca de 40. Pensaram em fretar um barco para os levar para Portugal, mesmo sem vistos. Esse barco foi o Milena”.
[1] http://mvasm.sapo.pt/BC/Acto-de-consci%C3%AAncia/pt
Figura 10. O lugre «Milena» (Fonte:
http://marintimidades.blogspot.com/2012/11/milena-1948-memorias-de-uma-campanha.htm)
http://marintimidades.blogspot.com/2012/11/milena-1948-memorias-de-uma-campanha.htm)
O “Milena” foi construído em 1918, na Flórida, nos EUA. Com o nome Burkeland, pertencente a J.A. Merritt & Co, Pensacola, Florida, navegou entre 1918 e 1935. Foi adquirido em Génova pela Indústria Aveirense de Pesca, Lda., (IAP), de Aveiro, tendo iniciado a atividade de pesca em Portugal em 1936. Durante os anos de 1940 e 1941, o navio efectuou viagens de comércio e de transporte de passageiros, como a relatada nesta história, tendo regressado à pesca na campanha de 1942. Foi reconstruído em 1943 e acabou a sua atividade em 1958, devido a um naufrágio a 2 de setembro de 1958 em Virgin Rocks, Terra Nova. [2]
A forma como foi recrutado este navio, que na altura estava a dedicar-se à pesca de sardinha, permanece algo incerta. Na página da «Sousa Mendes Foundation» pode ler-se que a embarcação teria sido “fretada por financeiros belgas e holandeses para um grupo de cerca de 50 passageiros”. Jeannette Valerie van den Bergh Fischer, no testemunho já referido, afirma que os passageiros teriam pago “ao capitão do barco ou à empresa, o nome do capitão era, creio eu, António Francisco Corujo”, sendo que a filha do capitão Corujo também entrevistada para a mesma série refere que “não sabe se pagaram à empresa, mas ao capitão nada foi pago”.
[2] [Fonte: http://marintimidades.blogspot.com/2012/11/milena-1948-memorias-de-uma-campanha.html]
A forma como foi recrutado este navio, que na altura estava a dedicar-se à pesca de sardinha, permanece algo incerta. Na página da «Sousa Mendes Foundation» pode ler-se que a embarcação teria sido “fretada por financeiros belgas e holandeses para um grupo de cerca de 50 passageiros”. Jeannette Valerie van den Bergh Fischer, no testemunho já referido, afirma que os passageiros teriam pago “ao capitão do barco ou à empresa, o nome do capitão era, creio eu, António Francisco Corujo”, sendo que a filha do capitão Corujo também entrevistada para a mesma série refere que “não sabe se pagaram à empresa, mas ao capitão nada foi pago”.
[2] [Fonte: http://marintimidades.blogspot.com/2012/11/milena-1948-memorias-de-uma-campanha.html]
Figura 11. António Francisco Corujo, capitão da embarcação «Milena», s/d (Fonte: https://qmais.pt/cemiteriossalvador/biografia.php?Lang=pt&Sel=8445)
António Francisco Corujo nasceu em Ílhavo, em 1891, tendo sido “sempre um oficial de Marinha Mercante muito zeloso e considerado, tendo servido nos últimos anos da sua vida profissional, como capitão da Empresa Secil” [3]. Em 1940, António Corujo era capitão da marinha mercante antinazi, a favor dos aliados. Não compreendia as atrocidades que faziam.
Conforme relatam Jeannette Valerie van den Bergh Fischer e a filha de António Corujo, “enquanto esperavam para embarcar, um dos passageiros ouviu um rumor de que o consulado português começara a emitir vistos em Baiona. Ele pegou nos passaportes dos refugiados a bordo, foi até Baiona e horas depois regressou trazendo os passaportes carimbados e assinados por Sousa Mendes. O capitão Corujo trouxe todos os refugiados que podia, dado que ele estava em França, no cais, e foram entrando no barco até poderem. Dizia ele que não se esquecia da cara dos refugiados que ficaram no cais sem poderem vir embora”.
A filha do capitão refere, ainda, que “alguns refugiados dormiram em cadeiras porque não havia beliches. O meu pai deu o seu beliche a uma senhora grávida para ela ficar mais confortável”. O Milena zarpou apenas a 22 de junho de 1940 e deveria chegar ao Porto em quatro dias, mas logo no primeiro dia houve uma tempestade terrível. O barco ia a caminho de Portugal, mas teve de aportar e abrigar-se no porto de Santander em Espanha. A viagem era feita em comboios porque tinham receio de serem torpedeados pelos nazis.
[3] https://qmais.pt/cemiteriossalvador/biografia.php?Lang=pt&Sel=8445
Conforme relatam Jeannette Valerie van den Bergh Fischer e a filha de António Corujo, “enquanto esperavam para embarcar, um dos passageiros ouviu um rumor de que o consulado português começara a emitir vistos em Baiona. Ele pegou nos passaportes dos refugiados a bordo, foi até Baiona e horas depois regressou trazendo os passaportes carimbados e assinados por Sousa Mendes. O capitão Corujo trouxe todos os refugiados que podia, dado que ele estava em França, no cais, e foram entrando no barco até poderem. Dizia ele que não se esquecia da cara dos refugiados que ficaram no cais sem poderem vir embora”.
A filha do capitão refere, ainda, que “alguns refugiados dormiram em cadeiras porque não havia beliches. O meu pai deu o seu beliche a uma senhora grávida para ela ficar mais confortável”. O Milena zarpou apenas a 22 de junho de 1940 e deveria chegar ao Porto em quatro dias, mas logo no primeiro dia houve uma tempestade terrível. O barco ia a caminho de Portugal, mas teve de aportar e abrigar-se no porto de Santander em Espanha. A viagem era feita em comboios porque tinham receio de serem torpedeados pelos nazis.
[3] https://qmais.pt/cemiteriossalvador/biografia.php?Lang=pt&Sel=8445
Figuras 12 e 13. Páginas iniciais do «Diário de bordo» de de Adele van den Bergh onde esta relata vários pormenores da estadia em Baiona e da viagem no Milena, s/d (Fonte: Arquivo privado de Jeannette Valerie van den Bergh Fischer)
O navio chegou ao porto de Leixões a 29 de junho de 1940 [4]. Como refere Jeannette Valerie van den Bergh Fischer, “a viagem para todos estes refugiados significou: vida, liberdade e um enorme alívio por terem escapado às garras dos nazis. Mas eles não tiveram noção do sacrifício que foi feito, pela sua sobrevivência, por Aristides de Sousa Mendes. Só muito mais tarde é que alguns souberam, mas nem todos. Muitos morreram antes de saberem isso”.
[4] Consultar o testemunho, em forma de diário, de Adele van den Bergh onde esta relata vários pormenores da estadia em Baiona e da viagem no Milena (https://sousamendesfoundation.org/family/van-den-bergh).
[4] Consultar o testemunho, em forma de diário, de Adele van den Bergh onde esta relata vários pormenores da estadia em Baiona e da viagem no Milena (https://sousamendesfoundation.org/family/van-den-bergh).
Figura 14. Ficha de refugiada atribuída a Adele van den Bergh atribuída pela PVDE, 2 de julho de 1940 (Fonte: https://sousamendesfoundation.org/family/van-den-bergh)
Conforme se pode atestar pela página dedicada a esta família na Sousa Mendes Foundation, Simone e a sua filha Tamara partiram de Leixões, Portugal, para Inglaterra, por volta de 22 de julho de 1940, a bordo do Benedict, um navio de carga com destino a Liverpool, Reino Unido, onde chegaram no dia 29.
Figura 15. Navio Excalibur, s/d (Fonte: https://sousamendesfoundation.org/ships/excalibur)
Figuras 16 e 17. Lista de passageiros do Navio Excalibur da viagem Lisboa - Nova Iorque, 28 de agosto de 1940 (Fonte: https://www.familysearch.org/ark:/61903/3:1:33S7-95N5-97ZP?i=977&cc=1923888&personaUrl=%2Fark%3A%2F61903%2F1%3A1%3A24LS-TDM)
Apesar de no início de julho ainda estar a viver no Porto, como atesta a ficha de refugiada que lhe foi atribuída pela PVDE a 2 de julho, Adele terá permanecido algum tempo em Lisboa, onde estava no Hotel Tivoli, ao cuidado dos seus tios Abraham Albert Andriesse e Elisabeth Gabriella Andriesse (van den Bergh), conforme se comprova na lista de passageiros do navio Excalibur que parte desta cidade a 28 de agosto de 1940, com destino a Nova Iorque [5]. Apesar de ter formação universitária, viajou com o Dr. e a Sra. Serge Voronoff (cirurgião francês de origem russa) na qualidade de "criada" ou cuidadora dos seus cães. Sónia viajou de Lisboa para Nova Iorque no navio San Miguel em outubro de 1940.
[5] A história da jornada de fuga da Europa de Abraham Albert Andriesse e Elisabeth Gabriella Andriesse (van den Bergh) é relatada no livro «Ontkomen: het vluchtverhaal van Albert en Ella Andriesse-van den Bergh 1940-1941» editado pelo historiador Dr. Bart Wallet. Estes documentos autênticos - conhecidos durante décadas apenas nos círculos familiares - fornecem uma visão única da vida da elite judaica holandesa nos primeiros anos da Segunda Guerra Mundial. O texto inclui uma introdução e textos explicativos, com grande atenção à excecional emigração legal de um pequeno grupo de judeus holandeses do território ocupado. A secção fotográfica contém muitas fotografias e documentos originais dos arquivos da família, entre outros.
[Fonte: https://www.amazon.com.br/Ontkomen-vluchtverslag-Albert-Andriesse-1940-1941/dp/9023954092]
Como nos relatou Jeannette Valerie van den Bergh Fischer, a história da sua mãe, Adele van den Bergh, é paradigmática no que diz respeito à importância do gesto de desobediência de Aristides de Sousa Mendes, em Bordéus e Baiona, atribuindo vistos que salvaram milhares de refugiados, apesar das instruções em contrário de António de Oliveira Salazar. De facto, Adele, ao ter viajado com os avós e restantes familiares e ter conseguido o visto do cônsul português, é a única da sua família mais restrita que escapa à deportação para os campos de concentração nazis. A título de exemplo, a sua mãe, Jeannette Elizabeth van Dantzig van den Bergh, foi deportada para Westerbork e daí para o gueto de Theresienstadt no Transporte XXIV/7 de 9 de setembro de 1944, tendo sido libertada em maio de 1945. Os seus dois irmãos, Betsie e Joost, terão também estado prisioneiros em Westerbork. O pai, o professor universitário George van den Bergh, esteve preso em Buchenwald, de 8 de outubro de 1940 a 11 de agosto de 1941, com o n.º 3547, tendo sobrevivido à guerra.
Este trabalho baseou-se no contacto eletrónico e telefónico com Jeannette Valerie van den Bergh Fischer e na consulta da seguinte webgrafia:
https://sousamendesfoundation.org/family/van-den-bergh
https://opto.sic.pt/content/c6956f68-f6e6-47c3-925c-ebdf437d389f
https://qmais.pt/cemiteriossalvador/biografia.php?Lang=pt&Sel=8445
http://marintimidades.blogspot.com/2012/11/milena-1948-memorias-de-uma-campanha.htm
https://www.geni.com/people/Adele-Margaretha-van-den-Bergh/6000000023001884228
Trabalho realizado por: Cristina Almeida, 9.º B
[5] A história da jornada de fuga da Europa de Abraham Albert Andriesse e Elisabeth Gabriella Andriesse (van den Bergh) é relatada no livro «Ontkomen: het vluchtverhaal van Albert en Ella Andriesse-van den Bergh 1940-1941» editado pelo historiador Dr. Bart Wallet. Estes documentos autênticos - conhecidos durante décadas apenas nos círculos familiares - fornecem uma visão única da vida da elite judaica holandesa nos primeiros anos da Segunda Guerra Mundial. O texto inclui uma introdução e textos explicativos, com grande atenção à excecional emigração legal de um pequeno grupo de judeus holandeses do território ocupado. A secção fotográfica contém muitas fotografias e documentos originais dos arquivos da família, entre outros.
[Fonte: https://www.amazon.com.br/Ontkomen-vluchtverslag-Albert-Andriesse-1940-1941/dp/9023954092]
Como nos relatou Jeannette Valerie van den Bergh Fischer, a história da sua mãe, Adele van den Bergh, é paradigmática no que diz respeito à importância do gesto de desobediência de Aristides de Sousa Mendes, em Bordéus e Baiona, atribuindo vistos que salvaram milhares de refugiados, apesar das instruções em contrário de António de Oliveira Salazar. De facto, Adele, ao ter viajado com os avós e restantes familiares e ter conseguido o visto do cônsul português, é a única da sua família mais restrita que escapa à deportação para os campos de concentração nazis. A título de exemplo, a sua mãe, Jeannette Elizabeth van Dantzig van den Bergh, foi deportada para Westerbork e daí para o gueto de Theresienstadt no Transporte XXIV/7 de 9 de setembro de 1944, tendo sido libertada em maio de 1945. Os seus dois irmãos, Betsie e Joost, terão também estado prisioneiros em Westerbork. O pai, o professor universitário George van den Bergh, esteve preso em Buchenwald, de 8 de outubro de 1940 a 11 de agosto de 1941, com o n.º 3547, tendo sobrevivido à guerra.
Este trabalho baseou-se no contacto eletrónico e telefónico com Jeannette Valerie van den Bergh Fischer e na consulta da seguinte webgrafia:
https://sousamendesfoundation.org/family/van-den-bergh
https://opto.sic.pt/content/c6956f68-f6e6-47c3-925c-ebdf437d389f
https://qmais.pt/cemiteriossalvador/biografia.php?Lang=pt&Sel=8445
http://marintimidades.blogspot.com/2012/11/milena-1948-memorias-de-uma-campanha.htm
https://www.geni.com/people/Adele-Margaretha-van-den-Bergh/6000000023001884228
Trabalho realizado por: Cristina Almeida, 9.º B